Marley & Eu no divã

Ao iniciar minha leitura, observei a riqueza de detalhes na matéria descrita no livro e por este motivo resolvi após algumas páginas escrever esta análise.

Quem ainda não leu o livro, eu recomendo, pois é hilário e se assemelha muito aos problemas existentes aqui no Brasil.

Quando me refiro aos problemas, eu estou falando dos de ordem profissional e comportamental canino.

Logo nas primeiras páginas, já pude observar que Marley teria sérios  problemas com ansiedade de separação e excesso de dominância, problemas muito comuns em cães na época atual. Esses distúrbios são provocados por excessos no relacionamento com o cão.

O ser humano cada vez mais, procura encontrar nos animais, aquilo que não encontra em seu relacionamento com a própria espécie. Isso provoca vários distúrbios comportamentais. Distúrbio comportamental é todo comportamento que aos olhos do ser humano está errado, porém aos olhos do cão não está, pois no seu relacionamento diário, ele recebeu informações, que o levaram a se portar daquela maneira.

Este livro nos traz uma riqueza muito grande de manifestações que implicam em ansiedade de separação e excesso de dominância. Eu sei que muitas das pessoas que leram este livro, enxergaram em Marley seu próprio cão. Por esse motivo quero aproveitar para esclarecer o que se passa na cabeça desses cães, pois na maioria das vezes, eles não são agraciados com a sorte de ter uma família como a do Sr. John Grogan.

Vou através dessa análise explicar melhor esses distúrbios e vamos iniciar pela Ansiedade de Separação.  O cão tem seu primeiro contato com esse problema, ao ser separado da mãe. Vimos que Marley em sua primeira noite teve problemas para ficar só em sua garagem; aquele já era um problema de ansiedade de separação, que foi agravado pelo fato do Sr. Grogan ter levado Marley para dormir em sua companhia. Existem maneiras para se amenizar esse sentimento, porém Sr. Grogan como várias outras pessoas desinformadas, tomou a decisão de levar Marley para o quarto. Sua esposa também não ficou atrás como toda boa mãe, ela querendo saber se seria uma boa mãe para seus próprios filhos, resolveu transferir para Marley o papel de filho. Eles só não pensaram como Marley se sentiria ao ter que ficar preso na garagem quando eles saíssem para trabalhar. Todo esse comportamento errado por parte dos proprietários, fez com que desencadeasse uma dependência excessiva por parte de Marley, fazendo com que ele se tornasse um cão dependente da presença dos donos e inseguro ao se encontrar só. Essa insegurança associada ao fato da região em que a família Grogan morava ser uma região de fortes tempestades de verão, acabou potencializando o desenvolvimento de outro problema, que na maioria das vezes está associado à ansiedade de separação. Este problema é a fobia à raios e trovões.  Imagine você no lugar de Marley, um filhote de 60, ou 80 dias totalmente dependente da presença dos proprietários, preso em uma garagem, só, no meio de uma tempestade com raios e trovões. Isso gera insegurança e medo e sem ter como sair dessa situação, o cão tende a entrar em estado de histeria. A ansiedade de separação pode ser diagnosticada também com os seguintes sintomas na ausência do dono: – Destruir móveis (roer) – Latidos excessivos – Choro e uivos – Auto-mutilação – Fazer as  necessidades em local errado. O tratamento para esse tipo de problema é muito complicado, pois implica em um contra condicionamento que toma muito tempo do proprietário e um acompanhamento veterinário, pois na maioria dos casos se utiliza antidepressivos. Outra alternativa, é deixar o cão em Day Care , onde eles passam o dia em recreação.

Por esse motivo nunca faça de sua saída ou sua chegada um momento de expectativa para o cão, isso pode lhe trazer grandes problemas. Caso queira saber mais leia a matéria (Cachorro também sofre com a separação).

Os problemas não param por aí, a dominância é outro problema comum na vida de Marley e de muitos cães no mundo todo.

O excesso de dominância surge, quando os proprietários de cães de forma inconsciente passam para o animal a liderança da matilha. Isso é muito comum acontecer, com cães que se vêem humanizados pelos donos e que vivem dentro de casa. Uma comparação interessante a isso seria daquela criança que tem tudo, pode tudo e faz o que quer quando quer, ou seja, uma criança que não conhece o significado da palavra limite.

Os excessos passam informações para o cão de qual a sua posição dentro da matilha. Para os menos informados, os cães na natureza vivem em matilhas e com o ser humano ele julga estar vivendo em uma matilha, principalmente quando vive dentro de casa e acaba fazendo parte do contesto da família.

Em Marley pode-se ver isso durante boa parte do livro, o fato de ser um cão insubordinado, com demonstrações de monta e latidos excessivos ao chegarem estranhos. Outra demonstração muito clara foi quando Marley demarcou território nas pernas de um amigo do Sr. Grogan. Isso já ocorreu com nossa apresentadora de televisão Ana Maria Braga, quando sua cadela Belinha resolveu falar para ela quem manda no programa. A família Grogan deu sorte, pois Marley não tinha agressividade dirigida aos proprietários, algo que é muito comum em cães com um perfil elevado de dominância, Marley com certeza não era excessivamente dominante, apesar de ser um cão rebelde.

Quando se passa para um cão, que ele é o líder da matilha, com certeza a família com que ele vive terá sérios problemas de insubordinação, pois um líder pode tudo, ele faz tudo quando ele quer. O líder não obedece a subalternos, eles estão no topo da hierarquia. Eu gosto muito de dar exemplos para que as pessoas entendam melhor o que estou dizendo; um exemplo bem claro disso seria: “um faxineiro de uma empresa dando ordens para o proprietário da empresa, mandando-o  fazer  serviços que os demais empregados tinham que fazer”.

Outro fato interessante e que não posso deixar de mencionar aqui, pois está relacionado com dominância, foi o a tentativa de se adestrar Marley. Eu vou transcrever algumas pérolas que nos é passada no livro e comentarei a respeito. A primeira delas é:

Tome seu lugar, por favor – ela disse, seca. (a adestradora) Quando viu Jenny e eu puxando Marley até a posição, ela acrescentou: Vocês vão ter que decidir qual de vocês dois irá treiná-lo. Comecei a explicar que ambos queríamos participar para que cada um pudesse trabalhar com ele em casa , mas ela me cortou, dizendo: – Um cão – ela disse, forma contundente – só pode obedecer a um mestre. (pág. 66)

Isso é um absurdo. A partir do momento que existe uma hierarquia, o cão tem que obedecer a todos que estão acima dele. Ao ler um pouco mais o capítulo adestramento, pude observar que o adestramento ainda era realizado com forçamento e em grupo, este método está totalmente ultrapassado, ele não funciona, principalmente com os proprietários.

O Sr. Grogan mais uma vez não deu sorte, pois ele caiu na mão de mais um desses adestradores de fundo de quintal.

Após mais algumas linhas de leitura, vem a comprovação do que falei acima. A Sra. Dominatrix (a adestradora) após passar por uma humilhação proporcionada por Marley, entrega os pontos com mais uma Pérola, que segue descrito abaixo na íntegra.

Quando a aula terminou, ela me perguntou se eu poderia ficar um pouco mais. Esperei com Marley, enquanto ela respondia pacientemente às perguntas dos outros alunos da turma. Depois que o ultimo saiu, ela se virou para mim e, num tom de voz conciliatório totalmente inédito para mim, disse: – Acho que seu cachorro ainda está muito novo para ser adestrado. -Ele é um problema, não é? – repliquei sentindo um pouco de solidariedade da parte dela, já que havia passado pela mesma experiência vexatória. -Ele simplesmente ainda não está preparado par ter as aulas – ela respondeu. – Ainda precisa crescer mais um pouco. Comecei a perceber o que ela queria dizer com aquilo. -Você está tentando me dizer… – Ele distrai os outros cachorros. – … que você está .. -Ele é agitado demais. -…nos expulsando da turma? Você pode trazê-lo de volta daqui a seis ou oito meses. (pág. 71)

Para que o leitor entenda melhor meu ponto de vista, que é totalmente diferente da maneira de pensar da Sra. Dominatrix, vou  expor meu ponto de vista em duas etapas: a) Adestramento não educa o cão. O conceito da palavra adestramento deve ser revisto, vou fazer uma comparação, ensino e educação. Os pais acreditam que a escola vai dar educação para seus filhos, sendo que a criança dever ir à escola com o objetivo de adquirir cultura e conhecimentos através do aprendizado obtido pelas diversas matérias que são ministradas na escola. A educação vem de casa, uma criança sem educação é simplesmente incontrolável. b) O adestramento sim, a meu ver tem a ver com o ensino, porém discordo mais uma vez da Sra. Dominatrix que recomendou que o cão voltasse às aulas após um ano e que estava muito cedo para ele ser adestrado. Da mesma maneira que se descobriu que as crianças aprendem com mais facilidade indo para a escola mais cedo, o cão também segue a mesma regra. O adestramento do cão pode se iniciar nas primeiras semanas de vida.

Por esse motivo é muito importante alertar a todos, para importância de se contratar um profissional com qualificações comprovadas. Com certeza isso custa um pouco mais caro, porém, o proprietário não estará jogando seu dinheiro fora. Eu recomendo também que seja feito uma avaliação psicológica antes de iniciar o adestramento do cão. Caso haja algum problema de ordem comportamental, o psicólogo é a pessoa mais indicada para orientá-lo.

Como o leitor pode observar, não é fácil criar um cão, mas tudo se torna mais fácil, quando age da forma correta. A psicologia canina pode lhe ajudar nisso. Antes de adquirir um cão converse com um psicólogo canino, pois é muito mais fácil prevenir que remediar. Não culpe seu cão pelos seus erros, eles não são obrigados a entender o ser humano e sim o ser humano à eles.